"Ser feliz é uma actividade que requer toda uma vida e não pode existir em menos tempo" - Aristóteles, Ética a Nicómaco
terça-feira, 16 de novembro de 2021
Cápsulas de optimismo
As
transformações sofridas
Qual
esplendor de cápsulas de optimismo
De
janelas viradas
A
futuros certos
Prometem
recordes do lançamento de princípios
Nos
jogos olímpicos da volúpia
Nas
vias travessas do amor
E
das agonias do ódio
Ao
virar da esquina
Ninfas
descobertas a caminhar
Em
chão de urtigas
Por
entre lápides que são quedas
De
muros que soterram
Quem
vive a matar o tempo
Não
basta matar
Saudades
Matam
mais que o sal
Os
construtores de liberdade
Percebem
que a paciência
É
uma ferramenta chave
Para
desactivar desastres
E
que a atenção nunca é de mais
Quando
se trata de resolver problemas
Democracia
é parte da solução
Não
existe sem gente
Nem
pontes
Nem
ruas em todos os sentidos
Por
onde erra quem foge
À
discussão.
sábado, 23 de outubro de 2021
Democracia e Cultura (visível e escura)
O tema Democracia e Cultura é susceptível de árdua, mas muito proveitosa ponderação e análise, no âmbito da democratização, seja da cultura, seja da própria organização política, que o é da cultura, se considerarmos, como eu considero, que cultura é acto humano, tendo em mente que acto é uma forma de manifestação do indivíduo humano, racional, voluntária, consciente, num quadro de possibilidades das quais ele escolhe a melhor.
A cultura é isto. É tudo aquilo
que a humanidade, através dos indivíduos que a constituem, produziu, de alguma forma
objectivada, em sons, imagens, sinais, artefactos, enfim, meios de comunicação,
construções, marcas, registos, efeitos, resultados, intencionalmente, exercendo
uma escolha, numa panóplia de possibilidades, entre as quais, escolher não
escolher, conquanto as não escolhas não tenham originado cultura, por falta de
objectivação. Essa matéria escura da cultura, ainda hoje, até pode ser mais
abundante e determinante do que a outra, que se manifesta em acto de
objectivação, mas não deixa rasto.
A organização
política da sociedade, pela sua própria natureza, é cultura que se objectiva. E
entre os seus desígnios está alargar ou encolher o horizonte de possibilidades
de escolha, sendo que a possibilidade de o indivíduo escolher não escolher,
está sempre presente, quer o indivíduo tenha consciência, ou não, de que não
escolher tem implicações, corresponde a uma escolha.
Democratizar a
cultura faz sentido, até porque, se a cultura é produzida pelos humanos, nem
todos os humanos produzem cultura em igual medida e nenhum humano produziu ou
produz a cultura toda. De igual modo, nenhum humano tem acesso à cultura toda,
senão a uma pequeníssima parte.
A democracia, porém, enquanto domínio da expressão da maioria, exprime os interesses dessa maioria como eles se configuram no quadro de possibilidades vigente. A democracia, por si só, não altera o quadro de possibilidades, porque este é uma das limitações, condições, da democracia.
E democratizar a cultura não significa,
nem corresponde a produzir cultura democraticamente.
terça-feira, 19 de outubro de 2021
A realidade como ela é
Não nos basta bater com a cabeça na parede para podermos responder às questões do que é a realidade, se a parede é real, se o que pensamos é real e se essa realidade é como é, se tem de ser como é, se sempre foi o que é e se alguém sabe se será e o que será, etc..
O título do
livro, o mundo como ele é, do físico sueco Ulf Danielsson, independentemente daquilo que o autor defenda, é
sintomático de que estamos perante um problema de magnitude filosófica e
científica, mas não nos permite esperar que o mundo seja “como ele é”, a não
ser no sentido em que “o ser” do mundo é “não ser como é”. E não apenas num
plano estrito de processo ou de possibilidade de provar o que se diz, o que
reduziria o problema a uma limitação teórico-científica. O ser do mundo é não
ser como é, essa é a sua realidade. Nenhum fenómeno se repete. Nada ocorre duas
vezes. Neste ponto, mesmo as experiências e verificações científicas reconhecem
uma dificuldade.
A necessidade de
explicar como é que o mundo é não parece ter tanto a ver com as aparências de
ser (que são) mas sobretudo com o que parece mas não é (parece mais uma contradição).
Os filósofos
sabem-no desde que reflectiram sobre a natureza, pelo menos desde os jónicos e
os cientistas, nomeadamente os físicos, parece saberem-no melhor do que ninguém,
não apenas ao tentarem saber como as coisas (realidade) funcionam, mas também
ao tentarem explicar porque é que funcionam assim, se sempre funcionaram e se
funcionarão.
Há pelo menos
duas questões que podemos colocar para experimentar as dificuldades com que
deparamos no tocante à realidade: saber/dizer/declarar o que é “isto” e
provar/demonstrar o que se declara. À dificuldade de responder à questão, concreta,
por exemplo, “isto é uma pedra?”, acresce a dificuldade de provar e demonstrar.
Normalmente, as pessoas não questionam, nem discutem se a parede existe ou não,
se é real ou não. O que tem suscitado discussão é “o que é a parede?” e a prova
e demonstração do que se diz. Não é se a parede está lá. Os físicos também não
discutem se existe o sol e a terra. Mas a questão não me parece disparatada.
Voltando à
questão de saber “o que é isto?”, os cientistas têm dado um imenso contributo,
é certo, mas ainda não chega, como se pode ver do facto de a física manter em
aberto questões fundamentais sobre a realidade física. Mas também temos de
considerar a existência de realidades que os físicos não estudam, como os
pensamentos e os sentimentos e a biologia que, ao que parece, não deixam de ser
realidades físicas, ainda que mais efémeras umas do que outras.
Não obstante, e
isto toca com o problema de o mundo “ser como é”, se fossemos capazes de
responder à questão “o que é isto?” e de o provar, essa resposta,
provavelmente, teria de responder às outras questões “o que isto foi?”, “o que
isto será?”, sabendo nós, por experiência, que, na realidade, mesmo para os
físicos, se há um modo de ser das coisas esse modo de ser é que elas (mesmo se sabemos
como foram), não são como são, nem sabemos como serão.
Haverá forma de
saber se este problema se resolveria se um poder para isso suspendesse o
movimento dos corpos (e das partículas, ou cordas, ou outra coisa desconhecida,
cancelando a gravidade, a força electromagnética e as forças nucleares)? Os
cérebros não seriam suspensos também?
segunda-feira, 11 de outubro de 2021
A toque de caixa
Ao toque de tambores e de clarim. Muitas batalhas foram perdidas
porque o fragor dos ferros e dos gritos não permitiram que os combatentes
ouvissem os toques da ordem. Ficavam assim à mercê do inimigo, desorientados,
em vez de fugirem, resistiam, mas sem rectaguarda, ou fugiam desordenadamente
na direcção errada. A comunicação, nas batalhas, sempre foi um dos pontos chave
e mais difíceis de conseguir e de coordenar, sobretudo antigamente, em que os
sinais sonoros para chegarem às tropas, não deviam confundir-se com os sinais
do inimigo, perderem-se no espaço ou serem distorcidos pelo ruído produzido
durante a batalha. A comunicação é, se prestarmos alguma atenção ao problema, o
calcanhar de Aquiles, da guerra como da
paz.
A guerra é para
especialistas, como a ciência é para especialistas, mas as técnicas e os
combates são para todos. À ciência não pode ser imputada nenhuma
responsabilidade. A pólvora não tem culpa de ser explosiva, nem as máquinas têm
culpa de demolir, nem o fogo tem culpa de devorar e liquefazer tudo, até um
certo ponto. Nenhuma droga, ou aeronave, podem ser responsabilizadas dos danos
que causam. Assim como um cão ou um vulcão. Mas podemos sempre tentar metê-los
a todos numa prisão. Só que, enquanto o homem continuar a existir, à solta, ou
não, vai ser obrigado a lutar pela sobrevivência e isso tem de ser colectivo. Infelizmente,
a humanidade não tem sido muito bem-sucedida na tentativa de fazer o melhor. A
natureza, incluindo a humana, é indócil e rebelde, para não dizer inábil, relativamente
a uma bondade objectiva dos nossos actos construtivos, tantas vezes com imenso
trabalho e sacrifício. Afinal, temos andado a construir destruindo, ou a
destruir construindo? Quanto das construções são destruições irreversíveis? E
como remediar e evitar continuar?
É preciso
trabalhar arduamente para que tudo continue na mesma, e não se consegue. Mas
para que as coisas mudem, basta não fazer nada.
A ciência não
tem defeitos morais, é como a sabedoria, e como Deus. São bons por definição e
não são virtuosos, em sentido moral, porque virtuoso é atributo moral de acto
humano. Não fazem e nunca fizeram mal a ninguém. São edifícios ideais,
abstractos,
Já a guerra tem
de ser vista de outro modo e noutra perspectiva. A guerra é actividade humana,
conjugada para infligir mal. Se porventura alguém faz ciência para infligir mal,
não é o acto de fazer ciência que faz mal, mas o acto de guerra, em intenção ou
execução consequente.
quinta-feira, 7 de outubro de 2021
Quem não gostaria de saber?
Não
pretendo, nem seria capaz de dizer o que a universidade é, ou foi, nem o que
pode ser, nem o que deve ser e, menos ainda (se é que tal é possível), o que
será. Pretendo dizer, simplesmente, que não acredito que haja alguém capaz de o
fazer. E creio que não estou a jogar com as palavras para além do significado
que elas, prosaicamente, comportam. Claro que a minha opinião, corresponda ou
não à minha crença (tantas vezes se afirma uma coisa e se pensa outra), não
vale pelo que penso, mas pelo que significa.
Neste
caso, o que ela significa é anódino (cada um acredita naquilo que lhe aprouver),
enquanto não apresentar razões plausíveis para afirmar o que afirmo.
Para
que não seja completamente gratuito, admitindo que não é de tal modo óbvio o porquê
de «não acreditar que haja alguém capaz de o fazer», passo a esboçar meras
presunções.
Se
para dizer o que é uma pedra não basta a ciência toda, nem a filosofia toda,
nem toda a poesia, pode ser uma simples pedra no sapato, ou na cabeça, em forma
de um rei, ou de pavimento, pedra angular, pedra preciosa, parte de um todo desconhecido,
que não pode ser deduzido dela, que não existe sem ela, não sabendo nós se
subsistirá o significado que ela tem para a ciência, para a filosofia, para a
poesia e, inerentemente, para o homem, se este desaparecer, quanto mais não
será necessário para dizer o que a universidade é? Haverá alguma ciência, ou interconexão
de ciências que nos disponibilize a representação do que a universidade é de um
modo pelo menos tão claro como é possível representar os ambientes em que terá
surgido a vida?
Se
é difícil ou impossível dizer o que uma coisa é, quanto mais difícil não será
dizer o que ela foi?
Se
não sabemos responder a nenhuma destas perguntas, como saberemos o que a
universidade pode ser? E se não soubermos o que pode ser, que sentido faz dizer,
ou até pensar, o que deve ser?
E
quanto ao que será? Quem não gostaria de saber?
quarta-feira, 29 de setembro de 2021
A Escola e os gurus
A escola, tal
como a conheço, era uma circunstância odiosa, tal como a catequese e a igreja,
ainda que (ou mais ainda, se) a criança fosse promovida a estrela da companhia.
De tal modo colocava
as crianças perante as suas incapacidades, dificuldades, limitações, mas sempre
contracenadas com figurinos histriónicos elevados à categoria de exemplo e
prova de que é possível, os outros conseguem, tu não.
O outro era, e
continua a ser, a marca inatingível. Há sempre outros. Há sempre os melhores,
que são os outros. E, por alguma razão, há sempre quem ache isto bem. O limite
é Deus. Não existe, nunca existirá, porque Deus ficava estragado se fosse
limitado.
Não existe
limite quando o outro é o limite ao devolver que limite tem um nome “tu”, tu és
o limite, o limite és tu.
E então, a escola,
a catequese, a igreja, os modelos de pensamento, de organização social, de produção,
de educação, de ensino, de justiça, de beleza, de santidade, de virtude, enfim,
de valor, de sucesso, de realização, operam sobre a criança e exercem uma força
que será tanto mais fantasmagórica e ilusória quanto mais ela se aperceber de
que a realidade, a sua experiência, os seus sentidos, tendem a refutar as ideias
de que é possível ou desejável que corresponda a algum modelo, ou personagem, que
tampouco está gizado, que tampouco existe, que tampouco interessa, que nem
sequer é humanamente razoável…
E começa a
perceber que, tal como as histórias da carochinha, é tudo um faz de conta. Há
crianças que vivem num mundo faz de conta mais interessante, em que elas
próprias fazem de conta e dão-se bem com isso. Outras nem tanto. E outras não.
O faz de conta não é igual para as bruxas e para as criancinhas.
Depois, o faz de
conta, que conta, e de que maneira, continua a ser um jogo que dificilmente o
jovem recusará jogar, mesmo que saiba que é viciado e vai perder. Se sabe que
vai ganhar, mesmo sabendo que é viciado, joga, porque não pode deixar de o
fazer.
A ideia de que o
que importa é participar e não ganhar, é bem verdadeira, porque quem ganha não
se importa, quem perde é que tem de se importar.
Mesmo no
desporto, o espírito desportivo está ao serviço de um resultado, de tal modo
que não tens de saber jogar, ou de jogar bem, ou de jogar melhor, se souberes
alcançar o resultado. E se não for o resultado do jogo, daquele jogo, que seja
o resultado do teu jogo, no qual aquele é apenas um episódio, uma jogada, como
uma manobra para despistar o adversário.
Mais tarde, já adultos,
talvez peões de jogos cada vez mais complexos, talvez sonhando, ainda,
quixotescamente, serão tanto mais a realização daquilo que para eles o ensino e
a educação prepararam, quanto menos tiverem a noção daquilo em que os tornaram,
ou em que eles se tornaram.
Quanto aos gurus,
se fossem árbitros do jogo, talvez alterassem as regras, mas a viciação não,
até porque faz parte do jogo e não respeitar as regras também é batota.
quinta-feira, 23 de setembro de 2021
Disse república?
Eu penso que sou republicano, mas o país é uma caterva de tribos nostálgicas das fachadas de linhagens e fidalguias que nunca tiveram, que praticam a vassalagem, o nepotismo, o compadrio e o favorecimento, como sistema de valores democráticos, perante o altar da inclusão, igualdade de oportunidades e liberdade, desde que lhes esteja assegurada a parte de leão, em que a justiça prima por não cometer injustiças contra algum corrupto menos feliz.
Quem não
gostaria de ser monárquico se pudesse ser rei, de preferência absoluto?
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