quinta-feira, 10 de março de 2022

Como só a harmonia consegue

Quem há-de dizer

Com todas as letras

Para as estrelas

E daí

Obter resposta

Numa língua que não existe

Aplacar em letra morta

O silêncio

Pisar escombros com a planta dos pés

E como antídoto ensurdecer

Com sofismas

Para dores fantasmáticas

Em doses homeopáticas

Diluídas na metafísica

Do maravilhoso aquário

De argumentos

Sem se molharem

Sem afundarem

Patinando artisticamente sobre uma superfície gelada

De postulados cosmológicos

E imunes às forças opostas

Como só a harmonia consegue

Em parcimoniosos compassos

Ou bélicas coreografias

Quem há-de sacrificar

Tudo o que resta

O que importa salvar

Não é a verdade

Nem do que sabemos

Nem do que dizemos

É o que somos

E o que fazemos

É o que as coisas são

Até se tornarem noutras coisas

Que não reconhecemos senão

Na nossa visão

Por mais desculpável que seja

A nossa falta de visão

Por mais que se agigante

O espectro da invisibilidade

Na luta que se encarniça de olhar para si mesma

Como inimiga

Que não pode evitar

Nem vencer

Nem servir de alimento a uma letra

Para não dizer pomba

Morta

Da paz.

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