quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Lina 4


Seguia-te sem pestanejar

Fascinado pela desenvoltura

Com que alçavas o saiote

Encantado pela censura

Com que punhas a mão

No decote

À portinhola da estufa

Dizias em surdina

Quase a pedir

Devagarinho que a Lina

Não nos pode descobrir

                         Carlos Ricardo Soares 


terça-feira, 29 de outubro de 2024

Lina 3


Sinto-a tão perto

Ouço-a a arfar

Vamos à socapa

Se ela nos vir

Nada nos pode salvar

        Carlos Ricardo Soares


Lina 2


Coisas de gaja libertina

Tarada por homem

Prometo contar

Se não tiveres vergonha

De deboches

Que fazem corar

Só de ouvir falar

Estou com medo

                    Carlos Ricardo Soares

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Lina 1

    

Está muito frio

Dizias-me ao ouvido

Calorosamente

Ali é a estufa

Só ela

Pode entrar ali

A Lina

A estouvada

Leviana de mil enigmas

                   Carlos Ricardo Soares


terça-feira, 22 de outubro de 2024

Penso que existo mas seria incapaz de prová-lo


Admito que, em grande parte, as questões do facto e da prova do mesmo não são redutíveis à questão da verdade. Esta é mais do que o facto e do que a prova. 
Não me custa admitir que ocorram mais factos do que aqueles que somos capazes de verificar e de provar. 
Eu penso que existo e, no entanto, não seria capaz de prová-lo, filosoficamente falando. 
Até para provar que nasci, frequentemente as autoridades me exigem uma certidão. Diante de mim, eles não se questionam sobre o facto da minha existência e do meu nascimento. Não lhes passa pela cabeça perguntar «prove-me que nasceu». E não importa se a certidão é um documento falso, o que interessa é que cumpre a sua função de representar a realidade de um indivíduo ter nascido. 
O mérito e a importância prática e teórica da filosofia têm a ver com o discurso sobre o ser (ou não ser).
Historicamente, os filósofos deram-se conta de que a linguagem, os sistemas de codificação e descodificação, tal como acontece atualmente com os sinais de rádio e de televisão, e dos sistemas de codificação informáticos, são por si mesmos uma realidade acerca da realidade que levanta problemas, não apenas práticos, mas também teóricos. 
A necessidade de justificar o que afirmamos sobre a realidade pode ser vista como a fonte da filosofia e do conhecimento, mormente científico.
As religiões tentaram resolver, ou contornar, ou responder ao problema do ser com «não sabemos o que é o ser mas sabemos aquilo que ele deve ser».
Os filósofos depararam com este problema maior e questionaram «o ser deve ser o que é ou o que sabemos que deve ser?». 
Mas, num certo sentido, é logicamente irrecusável que o conhecimento do ser deve ser como deve ser. Isto é o reconhecimento de que o conhecimento como ato humano que é não está fora da alçada da necessidade de escolha, neste caso, da escolha certa (verdade).

Carlos Ricardo Soares