terça-feira, 27 de julho de 2021

Otelo, o Oscar do 25 de abril de 1974

A minha juventude e educação religiosa católica, da época, não me permitiam simpatizar com revolucionários. Até o ensino da história, que nos era ministrado, por padres, ou seus apaniguados, ou outros que tais, grados ao regime (pude reconhecer mais tarde) tratava, quase sempre, os revolucionários e os rebeldes como Judas. Levei tempo a compreender que era fácil inverter os papéis, como eles faziam e tratar os revolucionários como Jesus.
A ordem estabelecida define sempre os rebeldes e os opositores e os contestatários e os insubmissos e os revolucionários, como um grande problema de “lesa majestade”, ou de heresia, ou de excomunhão, blasfémia ou de traição. Se essa ordem for rigidamente hierárquica, reage acidamente a qualquer atitude de desrespeito. Não reage com discussão de argumentos. O respeito, ou o respeitinho é uma estratégia ardilosa, mas muito eficaz para manter cada boneco no seu papel.
Hoje, pelo balanço que faço daquilo que Otelo representa e do papel que teve, nos contextos em que operou, mas sobretudo pelo que fez, por sua iniciativa e responsabilidade, considero-o um herói que tinha consciência disso e que desprezava, simplesmente, a caterva de carreiristas, de seguidistas e de camaleões oportunistas de que se viu rodeado, enfrentando-os, mas sem poder livrar-se deles.
De qualquer modo, Otelo seria capaz de pactuar com adversários?
Parece-me que o mal dele eram os adversários. 
Não há adversários perfeitos.
E nem os que pareciam segui-lo e pretendiam arregimentá-lo com promoções e “espólios” de guerra, deixavam de ser vistos como uma espécie de cobardes a quem dizia não.
Há pessoas que até na amizade veem uma forma de conluio indigno, de manipulação e de suborno incompatível com a rectidão e a probidade. É como se tivessem escrúpulo de serem desonestos e desleais e isso os impedisse de aceitar qualquer outro compromisso que não seja lutar contra os desonestos e desleais, ainda que lhes não tenham feito directamente qualquer mal.
Otelo parecia ter fobia a que, sequer, tentassem passar-lhe a mão pelo pêlo.
Assim, não lhe restavam alternativas. 
Do mesmo modo que não se pode ser equidistante de tudo, não se pode ser contra tudo.

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