Vou tocar simplesmente num ponto: a recuperação da função do Estado. Este é
um nó górdio. Não se trata de recuperar propriamente, mas de atribuir, sim,
atribuir ao Estado poderes que não tem e nunca teve. Só que o próprio conceito
de Estado, na atualidade, está desfasado e o Estado, na acepção clássica, já
deixou de existir.
De qualquer modo, os políticos, na sua proeminente parolice de arrivistas,
quais clérigos de antanho... adoram o Estado, que é um Estado desses políticos
oportunistas, rurais, labregos...É o que temos tido. E à sua sombra, medram os
que se dizem inimigos do Estado, privados muito interventivos e críticos do seu
peso. Sem o Estado não sobreviveriam.
E o Estado continua, como antigamente, na sua função espoliadora e
agressora, sem respeito pelos contribuintes. Ninguém quer um Estado destes, a
não ser os tais beneficiários, mormente os políticos, que todos conhecemos.
Isto até parece um discurso de extrema direita e fico preocupado, sinto-me mal
ao verificar que as críticas que se fazem ao Estado incidem sobre os partidos
políticos que têm governado tão mal...Os partidos que capturaram o Estado são
responsáveis por isso e devem ser responsabilizados.
Há um fracasso, que se manifesta mas não se assume, dos modelos políticos
em vigor. Há muito que se deveria ter resolvido o problema daquilo que pode e
deve ficar no âmbito do privado do que tem que ser regido e conduzido
coletivamente. Os líderes políticos continuam a portar-se como caixas de
ressonância de uma visão dos almanaques de há cem anos.
Ninguém com vergonha fala, hoje, em público, do alto dos seus milhões, para
dar lições à humanidade. O mercado tem uma lógica que pode ser boa ou má. O
Estado não tem sido capaz, em geral, de escolher o que deve ser mercado ou não
e isso está a ser fatal, sobretudo porque, hoje, não faz muito sentido falar de
Estado como boa solução ou a melhor e mais racional forma de gestão dos problemas humanos planetários e, quando falamos de Estados, subsistem ou agravam-se os problemas.
A iniciativa privada e o capitalismo são perfeitamente autofágicas,
amorais/imorais, ou seja, todo e qualquer problema que surja, é, mercantilmente,
positivo. A guerra, a destruição de uma floresta, a doença, a morte...Não
consegue ver nada de negativo, porque o negativo já não existe...
Se o Estado, no (des)concerto dos Estados, puder ter alguma função útil, e
volto a sentir incómodo ao dizê-lo, como se estivesse a concordar com os que
defendem o fim do Estado, deverá ser na identificação e preservação daquilo que
pode ser alienado à iniciativa privada sem prejuízo dos interesses coletivos.
Um Estado ao serviço de interesses privados é que não. Temos pago muito caro e
estamos fartos disso.