I
Na Vila das Línguas, cada habitante tinha uma língua especial. Havia quem tivesse língua de prata, encantando multidões com discursos que pareciam música. Outros, como a Gertrue, tinham língua de víbora. Bastava abrir a boca para espalhar veneno pelas ruas.
O padeiro, Ambrósio, era conhecido pela língua doce. Vendia sonhos e broas com elogios que derretiam o coração. Já o carteiro, Seminto, sempre apressado, tinha língua de palmo. Falava tanto que as cartas chegavam atrasadas.
Certo dia, chegou à vila uma forasteira chamada Luca. Tinha língua afiada e olhos curiosos. Bastou uma semana para descobrir que o provedor dos assuntos celestes, Teadoro, homem de língua de seda, escondia promessas falsas por trás de palavras suaves.
Luca, com sua língua solta, espalhou a verdade na praça. Alguns pediram que tivesse tento na língua, mas era tarde, porque a vila inteira já sabia. Teadoro tentou defender-se, mas ficou com a língua presa diante da multidão.
No fim, a vila aprendeu a valorizar quem tem língua de ouro, mas também a desconfiar de quem tem duas línguas.
E Luca? Tornou-se contadora de histórias, misturando língua morta com língua de fogo, criando contos que ardiam e encantavam.
Carlos Ricardo Soares