quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Nada isenta de peso

Nada é isento de peso

Nem esta sensação de ser elevado

Pela música da claridade

Deste pensamento que não tenho

Neste estar com saudade

Por não levar nada

Nem deixar nada para trás

Nem a impressão desta palavra

Nem a paz

Nem o futuro

Nem o passado

Nada é isento de peso

Nem um olhar imaculado

Na ponta de um espinho indefeso.

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

De cigarro na boca

Havia homens e mulheres procurando

Sombras atrás de uma cortina

Escutando música para preencher vazios

Das palavras da canção clássica

No momento de abraçar a imortalidade

Eram abraçados pela novidade

De estarem num cantinho escuro

Que os olhares não devassassem

Com um significado mesquinho

Que não via magia na dança impossível

Nessas devoções em templos improvisados

Invocando deuses e deusas do cabelo

E da roupa perdida

Com tanta humanidade na comoção

Como estavam implorando à solidão

Por felicidade que ninguém alcança

De cigarro na boca.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Estrada

Encontrei uma estrada

Que estava perdida

Que ia de um lado para o outro

E não saía daí

E só então percebi

Por que estava abandonada

A razão de ninguém seguir aquela estrada

Era que ela não levava a nada

E eu quis que essa estrada fosse minha

Como já alguma vez pensei que era

Para um mundo que tivesse sido criado

Só para mim porque sim

E dado assim

Para que eu pudesse fantasiar

O porquê de ter sido abandonada

Antes de saber o que é ser abandonado

Um poema que fosse a resposta ao desejo

De encontrar o fim

Desse poema ainda inconsistente

Que é fundamental escrever

Que é urgente concluir

Mas como? Mas qual?

Se a estrada continua para o desconhecido

Se o poema não resolve a ânsia

E torna maior a dor

Da distância donde vim

Até ali

E não torna menor a dor

Dali

Para diante

Por nada e sem nada

Cada vez mais sem nada

Porque encontrei

Uma estrada.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Se ao menos

Se ao menos fosse cavaleiro pela neve

Sem saber a hora nem o dia

Se ao menos fosse o passo ou a neve

Que pensamento seguiria

Sabendo apenas que a beleza morde

Como um lobo salta para as gargantas?

domingo, 4 de dezembro de 2022

Felicidade dos bichos da fruta

Dizer que me fazes tanta falta

Que muitas vezes me recolho ainda

No pomar onde me surpreendias nua

Quando andava a estudar a felicidade

Dos bichos da fruta

Sem fazer ideia de quem tu eras

Te tomava por uma depravada astuta

Destapando-se maliciosamente

De entre as videiras

Atravessando-se nos meus olhos incrédulos

Que te fixavam

Como ofegante me apressava para ti

Dizendo espera espera

Enquanto desaparecias

Furtando o sexo ao meu desejo

E eu ficava com as uvas

E o sol

Em todas as partes que tocava

Projetava a tua sombra.

 

sábado, 19 de novembro de 2022

Falar idiota

Os estranhos sentidos das coisas transformadas

Em sombras de outras coisas

Que não foram

Em barcos ancorados sobre o dorso

Que alguma vez tiveram

Quando foram nadas

Ou apenas eram

Desejadas

Estranhas ilusões

Que nos povoam realmente

E nos percorrem

Como se fossemos estradas

Que deixamos para trás

Porque não imaginamos

Que viriam sequer a existir

De uma forma que está longe

De ser a melhor possível

De alguém sentir outonos

Ou falar idiota.

 

terça-feira, 15 de novembro de 2022

Sensacional


O hábito ao que é sonante

E ensurdece

Ao que destoa e preocupa

Ao ruído esgotante

Às ladainhas e às rimas

Ao esquerdo direito

“Up” is...

Esquerdo

Como um rio murmurante

Que fica para trás

E se ouve constante

Ao que é doce

E viciante

Ao se não é

Que fosse

Comediante

À espoleta do relógio

E ao monólogo do lente

Entediante

É uma azáfama

Frustrante

E por aí adiante.