segunda-feira, 28 de maio de 2012

O saber sempre me fascinou II


Há algo de potencial demolidor na filosofia que faz sempre falta para nos libertar. É como se ela fosse o único direito que ninguém pudesse tirar. É um sentimento que lembra o da literatura, a liberdade que só conhece os limites da imaginação e do engenho verbal. 
Mas a filosofia é tão rebelde que não pactua com imaginações e engenhos, de tudo "suspeitando" e se distanciando, ao ponto de suspeitar de si própria. E era este tipo de "autofagia" ou inquietação que eu não desejava para a minha vida. A liberdade não me parecia, em caso algum, independente. O triunfo da filosofia, na minha perspectiva, não estaria na filosofia, mas em mim.



sábado, 19 de maio de 2012

O saber sempre me fascinou



O saber sempre me fascinou e com seu quê de desconcertante, do intuir ao pensar e sentir, pensar o que se sente e sentir o que se pensa, do formular ao comunicar e do representar ao fundamentar, a filosofia esteve sempre no centro das minhas atenções, como algo de indomável, sobre objectos indomáveis, tais como o pensamento histórico, ou económico, ou religioso. As assolapadas, e não raro pretensiosas, certezas das ciências não me seduziam tanto. O pão pão, queijo queijo, ocultava sempre qualquer coisa que eu ansiava desvelar. No fundo, talvez fosse a minha rebeldia em não me conformar com que as coisas tenham de ser como são. E a filosofia era como um oceano de vastos horizontes que não cessavam de se metamorfosear, ou tomar novas configurações, como um baralho ou uma mente que se desenvolve pela força do pensamento. Pensar sobre objectos presentes e pensar sobre memórias, de objectos, ou de acontecimentos, ou de pensamentos...Em vez de me sentir derrotado pela perspectiva das dificuldades, senti-me animado a progredir passo a passo, como se aprende a andar. E foi de pequenos prazeres de ir entendendo, ou de pensar que entendia, que me fui confirmando nessa curiosidade e nessa paixão (não declarada, insegura, hesitante e temerosa) do discurso filosófico.


sexta-feira, 18 de maio de 2012

A ideia de democracia e a partidocracia



Se a maior parte das pessoas é precisamente como os críticos da democracia, não confirmo nem desminto, mas não acredito. Em todo o caso, se assim fosse, esta seria a maior crítica que se poderia fazer à democracia. Não à ideia de democracia e às bondades do modelo puramente teórico, mas à realidade da nossa democracia partidária e aos seus vícios, sabendo nós, não obstante, que a democracia não se esgota nas instituições partidárias, autênticas sanguessugas do Estado (dos cidadãos) em cujas mãos as tais pessoas (a maioria, como diz) não podem deixar de estar.


Desculpabilizar os políticos, colocando em causa a maioria das pessoas, responsabilizando-as dos males da democracia, ou da sociedade, é algo de incongruente, como se os eleitores não pudessem responsabilizar os eleitos mas estes e só estes pudessem responsabilizar aqueles (até por terem votado neles).

Na realidade o que se passa é que, com mais ou menos votos, num sistema mais ou menos imperfeito, os eleitos assumem compromissos que não honram e, em vez de usarem os impostos dos contribuintes e o erário público para benefício da coisa pública, usam-nos para fins ilícitos, com clamoroso dano dos contribuintes.

Se um país for à falência por desgoverno e se os contribuintes cumpriram as suas obrigações, inclusivé a de votarem naqueles que deviam ter evitado o abismo, a única coisa de que podem ser culpados é de terem votado em quem votaram. Mas quem não votou neles, não. No entanto, sofre as mesmas consequências. E quais são as consequências para os eleitos que tinham o dever e a responsabilidade de gerir bem o Estado?

O povo faz o que lhe mandam, trabalha, faz guerras, paga impostos, paga as crises, paga as multas, o que deve e, muitas vezes, o que não deve, e cumpre o dever de votar. Se os eleitos agem mal, pelo menos, o povo deveria poder exercer alguma tutela sobre eles, sem ter de ser através deles próprios.

Mas não é razoável esperar que um trabalhador, além do seu trabalho, tenha ainda de fazer o trabalho daqueles que se candidatam como profissionais da política e ocupam cargos remunerados para isso, ou, pura e simplesmente, acreditar que está ao seu alcance trocar a sua profissão pela de político. Não esqueçamos que o apelo à participação cívica e política dos cidadãos é um apelo a trabalho suplementar não remunerado, enquanto que os políticos são eleitos e remunerados para o fazerem em representação daqueles.

E é inadmissível que os políticos "peçam" aos cidadãos para lhes dizerem, por exemplo, como é que se deve governar.



sábado, 28 de abril de 2012

Sobre a nossa democracia



Sobre a nossa democracia, penso que o povo só lhe viu as bandeiras e o folclore. Em democracia, o saber é "inerente" ao povo e toda a gente sabe que a liberdade é que importa. Só que a liberdade de uns, muitas vezes, choca e impede a liberdade de outros. E, enquanto uns aspiram à liberdade como ao maior bem e são, por isso, chantageados pelos "políticos", estes e outros, exercem uma espécie de liberdade sem barreiras, teoricamente legitimada por aqueles. A democracia e o nosso sistema democrático sempre nos foram apresentados como algo de sagrado e venerável e quem os ousasse questionar abertamente era interpretado (perseguido/acusado/diabolizado) de inimigo do povo, como «reaccionário», ou, pior ainda, como «fascista». Vai ser preciso questionar abertamente a bondade e a eficácia, a funcionalidade e as bases de um grande conjunto de ideias feitas, as quais, só por si, não são solução para os problemas. O Estado é um aparelho e é o aparelho do poder e do domínio. Um Estado democrático, no plano dos princípios, é um aparelho do povo ao serviço do povo. Na prática é um aparelho altamente apetecível para os partidos políticos e não apenas por serem partidos políticos, mas também por "representarem" interesses e poderes que se sobrepõem, ou conflituam, ou são contrários, ou são incompatíveis, com os do povo. E o povo, ao sentir isso, percebe que está entregue "à bicharada". Os elevados níveis de abstenção nas eleições não podem ser entendidos como apatia, antes pelo contrário. A participação política de quem vai votar só significa isso, que os partidos concorrentes conseguiram "mobilizá-los". A abstenção significa que os partidos concorrentes não conseguiram mobilizar esses eleitores. Não votar é um comportamento político cujo significado não pode ser escamoteado, apesar de os partidos políticos terem um especial interesse em valorizar quem vota e desvalorizar quem não o faz. No fundo, quem não vai votar comporta-se como se o seu voto não alterasse nada. E sabendo que, qualquer que seja o resultado eleitoral, se sujeitará, isso não significa que esteja de acordo ou que aceite esse resultado. É que, na realidade, mesmo que todos votassem, "a priori" já sabemos que resultado seria. Qualquer dos partidos concorrentes que ganhasse as eleições não alteraria aquilo que verdadeiramente importa alterar. O nosso sistema democrático é uma espécie de sistema fechado que não comporta soluções que o não comportem a ele. É um sistema de gestão de si mesmo. E, no entanto, é um sistema que já provou a sua inutilidade e, até, a sua grande inconveniência. Mas é um sistema que não comporta a possibilidade de o reconhecer, porque vive de se enaltecer a si mesmo.


quarta-feira, 25 de abril de 2012

Liberdade



Hoje, 25 de Abril. A liberdade é um daqueles conceitos com que, à falta de melhor, se faz uma bandeira. A liberdade é perigosa. A liberdade é a justificação para a opressão e a espoliação e a escravatura. 
Cuidado! É preciso pensar e repensar sobre a distância que vai daquilo que os dicionários dizem àquilo que a experiência nos ensina. Um dicionário não é o livro de todo o conhecimento. 
Com a liberdade se enganam aqueles que a têm como valor muito alto. Os oprimidos gritam por liberdade! Querem liberdade. A questão é que a liberdade não é boa só para os que a têm. 
A liberdade como princípio, ou como direito, é muito bonita, mas é uma oportunidade que não é para todos. Por exemplo, a liberdade interessa aos poderosos, ao capital, aos mafiosos, aos malfeitores. Mas a importância que a liberdade tem para os pobres, "escravos", oprimidos, não é a mesma que tem para aqueles. Estes aspiram à liberdade como ao maior bem. E é por isso que são (e têm sido) facilmente ludibriados. A liberdade, na prática, é desastrosa para quem não tem poder. 
Se aplicarmos este raciocínio ao ensino, as coisas podem assumir várias configurações. Actualmente, em teoria, ninguém está impedido de criar escolas e sistemas de ensino e programas iguais ou diferentes dos que existem. Por sua vez, ao Estado, enquanto estrutura "não livre", incumbe prosseguir orientações e exigências supostamente sufragadas pela vontade da população "pagante" ou contribuinte, ou simplesmente eleitoralmente relevante. Do ensino público não se espera que seja "livre" porque deveria ser regulamentado e programado em função da vontade democrática. O problema é que a democracia tal como a liberdade é um conceito que, na prática, está completamente subvertido. Com um punhado de votos, uma minoria, há um partido que faz o que quer. Não é o poder do povo nem o poder da maioria. É, realmente, uma ditadura da minoria, salvaguardados embora direitos fundamentais como liberdade de expressão e de manifestação. (Aliás, ditaduras de maiorias é coisa que nunca deve ter existido...). 
Que o Estado queira impor directrizes, leis quadro, orientações pedagógicas, conteúdos e objectivos de "manipulação" e "subalternização" do agentes educativos, acho nefasto e errado. Quanto mais os professores forem meros executores de programas e de conteúdos, mais subserviência e servilismo estúpido estarão a promover. E é contra esta tendência que a liberdade vai. Mas, para salvaguardar o mérito, os professores deverão estar sujeitos à liberdade de escolha dos alunos (e seus pais/responsáveis).



sábado, 14 de abril de 2012

A poesia é irredutível como a vida


A poesia é irredutível como a vida. A filosofia fareja-a e conspurca-a. A religião dis...puta-a mas não a dis...pensa. A ciência ignora-a. Nããão obstante, Aristóteles dizia que a poesia é mais científicaaa do que a história, pois esta nããão passa de uma simples colecção de factos empíricos, enquanto a poesia extrai de tais factos um juízo universal.
Em cada verso se abrem perspectivas plausíveis como brechas, para lá do horizonte implausível como uma muralha.



quarta-feira, 28 de março de 2012

Efeitos sem causa, causas sem efeito



Quanto aos efeitos sem causa, um exemplo apontado por alguns naturalistas ateus é o do cosmos e das leis da natureza, uma vez que o caos (em que tudo sem excepção acontece por acaso, ao ponto de ser impróprio dizer "acontece", porque por acaso nada acontece)nunca poderia criar ordem. Mas proponho outro campo fértil para a investigação, qual seja, saber se alguma vez existiu ou podia existir caos, bem como, causas sem efeito. Mas não confundamos o plano factual da causalidade com as necessidades da lógica.