"Ser feliz é uma actividade que requer toda uma vida e não pode existir em menos tempo" - Aristóteles, Ética a Nicómaco
domingo, 11 de junho de 2017
Filosofia e Ciência
À primeira vista e sem mais indagação, são as estratégias dialéticas de análise e síntese, que nos remetem para a diferenciação, tradicional, entre ciência e filosofia. Desde a filosofia do treinador de futebol até à filosofia da ciência, a capacidade de questionamento humano não conhece limites e chega mesmo a forçar os "cimentados" ou sedimentados limites da racionalidade. Este fulgor da filosofia, que ninguém nos tire, ninguém nos tirará. Esta verdadeira força (a juntar às outras forças da natureza), porém, é a mesma que anima a ciência.
De certo modo, a comunidade de cientistas e de filósofos acaba sendo constituída por cientistas, cada vez mais filósofos e por filósofos, cada vez mais cientistas.
Da descrição dos factos às interpretações e à fixação de sentenças, pode ir um complexo processo de validação, falsificabilidade, monitorização dos próprios processos indutivos/dedutivos, com todo o tipo de implicações, não apenas científicas, ou filosóficas, mas ideológicas e de conceção/visão do mundo e do homem. Se a ciência se abstém destas implicações, já a filosofia, não só não se abstém como se ocupa delas preferencialmente.
domingo, 4 de junho de 2017
Insolências Superiores
É possível imaginar imensos cenários sobre escolas possíveis, ou até sobre inexistência de escolas.
Se eu fosse criança não concebia e não queria escolas.
Se fosse adolescente, concebia e talvez quisesse escolas de jogos e desportos.
Como sou adulto amestrado e "conformado" com as realidades da vida (e sempre me fizeram saber que era um privilegiado, para que eu aprendesse, mas acho que não aprendi) lido com a realidade que tenho, por mais difícil que seja e...Por mais justificada que seja a organização e a classificação das pessoas (classificação numa sociedade "dita" sem classes), só o simples facto de odiar tudo isso exclui toda a possibilidade de sucesso e de felicidade e de concordância.
As crianças, de hoje mais do que as de ontem, têm uma percepção de que assim é. As informações contraditórias, os deveres contraditórios, os objetivos contraditórios, e sobretudo as hipocrisias, provocam curto-circuitos nos cérebros, ou pelo menos nas inteligências e geram desconfiança, agressividade, frieza, ódio...
A justificação nunca poderá envolver um desmesurado sacrifício, sob pena de não se justificar.
A primeira preocupação dos sistemas de ensino talvez devesse ser o respeito pelas pessoas e a atenção ao seu bem estar, alunos e professores. Colocar a tónica em aspetos disciplinares, muitas vezes para disfarçar incompetências, é velho de mais. O bem estar, não como um estado definitivo, mas como um objetivo prioritário, considerando que é um dos pilares construtivos por excelência e, já agora, dos mais pedagógicos e saudáveis.
Mas, pensem duas vezes, parem de instrumentalizar as pessoas e de tratá-las abaixo de robots, fazendo-as amargar ao máximo o seu estado de dependência. Não coloquem ninguém em estado de dependência.
Este é o pão nosso/vosso de cada dia.
Este "parem" dirige-se às Insolências "Superiores", como é vulgar dizer-se, ainda hoje, neste tempo civilizado de Venerandos "Juízes" e "Suas Santidades". Ó acólitos, prosélitos, nefelibatas e quejandos, coloquem-nos num pódio, atribuam-lhes medalhas, laureiem-nos, como fazem às misses... Mas acabem definitivamente com esta aberração/humilhação.
sábado, 27 de maio de 2017
Ciência, crença, credibilidade
Pelo respeito e pelo
interesse que merece a ciência (conhecimento e artes e competências, em geral,
são daquelas "coisas" que não se compram, ou se têm ou não e não há
dinheiro que nos emposse de talento como nos empossa de roupa), preciso dizer
que a ciência não está a sufrágio popular, nem qualquer outro e que ser
cientista não é uma questão de votos. Aquele nojo que as campanhas eleitorais
causam com a pedinchice de votos e todos os trejeitos e tiques de proselitismo
dos candidatos, para verem legitimado o seu lugar no poder, felizmente, não faz
parte do universo da ciência e o povo há-de aprender que o poder da ignorância
só dá prejuízo.
O poder da ignorância é, por
exemplo, viver de acordo com o critério do interesse pessoal. Do tipo, "o
que não me interessa, ou, o que não interessa, não vale".
À primeira vista, este
critério parece salvar tudo o que importa e substituir todas as discussões
sobre escolhas, mas só a ignorância consente numa aparência destas.
O partido da
"crença" foi, é e será, enquanto e tanto quanto formos ignorantes, o
maior partido da humanidade.
Crença, não em qualquer
coisa, mas em algo que acreditamos, na medida dos nossos interesses (instinto
de sobrevivência?).
A discussão não é sobre os
fundamentos da crença, mas sobre os interesses da crença. Está aqui envolvido
um sentido prático e uma racionalidade pragmática que são uma fortaleza
daquelas que não se construíam, nem antigamente.
Curioso é que a ciência,
quanto mais se apresenta como a solução, como a infalibilidade (Deus) que foi
retirando à infalibilidade religiosa, tanto mais contestação e desconfiança vai
gerando.
Chegados aqui, ocorre dizer
que não basta à ciência ser ciência para ter credibilidade. As pseudociências,
não sendo ciências mas parecendo, às vezes, têm mais.
Ou seja, o problema da
ciência como crença é um falso problema ou um não problema. O problema é,
sobretudo, de crise de credibilidade da ciência.
Não de credibilidade enquanto
conhecimento que, em geral, não é questionado, mas de credibilidade enquanto
instrumento, que está nas mãos de quem tem interesses que não coincidem com os
interesses dos outros.
Ciência, religião, futebol,
partidos políticos, quanto à questão dos interesses e da credibilidade, jogam
num campo, quanto à questão da crença e do conhecimento, jogam noutro.
Os adeptos que fazem claque
num dos campos, podem ser adversários ou inimigos no outro.
A complicação surge sempre
que nos pomos a falar de ciência e crenças sem definirmos previamente os planos
e os pressupostos, ou os termos, da discussão.
A crença, como dimensão do
conhecimento científico, não é o mesmo que a crença religiosa, a superstição, a
astrologia.
E, em geral, parece-me que a
força das crenças depende muito da credibilidade.
Se a tua crença é credível,
se merece confiança, seja pelos resultados, seja pelos valores envolvidos, o
mais provável é que não a abandones, porque ela serve os teus interesses.
terça-feira, 16 de maio de 2017
Fundamentos civilizacionais
É importante que tenhamos consciência de que
conhecimento científico se distingue do conhecimento vulgar ou senso comum e
que esta distinção não é apenas de grau. Em muitos aspetos o conhecimento
científico é paradoxal e contraditório relativamente ao senso comum, o que
dificulta/impede a vulgarização do conhecimento científico. Este apela, exige,
uma formação, disciplina, que não se compadece com saberes de audiva. Por outro
lado, a motivação para a formação, em geral, depende de muitos fatores e, entre
eles, a curiosidade/interesse, até não será o principal.
Os casos de paixão, seja pelo conhecimento, seja
pelas artes, seja pelas vertentes da vida, em geral, também são,
paradoxalmente, pouco conhecidos.
Em termos de conhecimento científico, pelo menos,
a paixão, supostamente.
Aparte estas questões, os desafios prefiguram-se
imensos, até para quem ousar empreender um percurso científico, quando estamos
inseridos e mergulhados num universo regido por culturas, ideologias, políticas
e religiões, que são o "modus vivendi" natural e relevante, que têm o
conhecimento científico na conta de especialidades herméticas.
Se ganharíamos em ter mais pessoas envolvidas e
dedicadas à ciência? Quantas mais melhor. O que poderá ser feito para cativar
pessoas para a ciência?
Atualmente vive-se uma crise de vocações em todas
as áreas, todos se queixam, a começar na igreja católica com falta de
sacerdotes e a acabar na política, com falta de candidatos idóneos.
Historicamente, se não me engano, o poder
económico tende a "ditar" os rumos, de sacerdotes, políticos, cientistas,
filósofos, artistas...
Mas há valores que, em determinados momentos
históricos, sobrelevam ao poder económico opressivo e obscurantista, que se
reclamam da luz, da inteligência e da liberdade, que agregam sociedades e
fundam civilizações.
O conhecimento científico é apenas um deles, que
convive e emparceira com fundamentos/projetos ideológicos, mais ou menos
operacionalizados politicamente e com religiões cujos fundamentos/cânones se
revelam suficientemente representativos para que lhes seja reconhecido um
estatuto de legitimidade que rivaliza largamente com qualquer formação
político-partidária.sexta-feira, 28 de abril de 2017
Iluminismo, democracia, educação
Até podemos ter iluminismo e
razão e entendimento, em suma, ciência e ideologia, mas se não tivermos vontade
e ação orientada pelo Direito, enquanto princípio normativo de ação e critério
de sanção, para valores comunitários, gregários, vinculativos, éticos, justos,
nem a democracia, nem a ciência e ideologia evitam o caos e o absurdo.
A educação para a democracia
é uma educação para valores de convivência, tolerância, aceitação, na liberdade
das diferenças. Mas a democracia tende a legitimar o domínio, até
irracional/pelas piores razões, de interesses que se fazem (podem não ser) prevalecentes
numa sociedade. E o que as pessoas concluem, basicamente, é: se a democracia
não serve os nossos interesses, não serve. E quem diz democracia diz outro
regime, forma de governo, partido, religião...A menoridade, o paternalismo,
toda a retórica em torno do "dever-ser" que não é, do poder-ser, que
não pode, do querer-ser, que interessa àqueles mas não nos interessa a nós, são
"ideais" que alguém pode, de algum modo acalentar, mas a realidade, a
tal que interessa à ciência, não se compadece do que interessa a A, B ou C. O
“ser” é o que não interessa. O que interessa é o resto. Por falar em retórica,
estamos cada vez mais submersos pela retórica, dos políticos que têm ouvidos e
boca, mas não têm cérebro e também daqueles cientistas que são boas arrecadações/compêndios
de ideias feitas e de tabelas e de nomenclaturas e de fórmulas, mas que não têm
inventividade para extrair da informação os corolários necessários. Vivemos num
tempo de estilização, estereótipos, padronização e reprodução
automatizada/estandardizada, supostamente para nos facilitar a vida e a morte,
mas mais esta. De qualquer modo, a educação dificilmente desempenhará o seu
papel "iluminador" se não for algo mais do que instrumento de
domesticação, seja em nome de que deus/"must" for.
quarta-feira, 19 de abril de 2017
Ciência e religião
Não sei quem foi a primeira pessoa que teve a ideia de deuses como
entidades antropomórficas...Mas admito que tenha sido o primeiro
"cientista", com o tal cérebro que "vê" da única maneira
que sabe.
A demanda de explicações é a essência da ciência.
A demanda de deuses é a demanda de explicações.
Para que um deus explique, necessário é ter sido encontrado.
Parece que foram encontrados muitos deuses que serviram de explicação para muitos fenómenos.
Parece também que foram encontradas explicações, deuses, contraditórias ou, pelo menos, não compatíveis. Essa era a ciência disponível para o cérebro que havia. Estava tudo em ordem com a evolução, com a natureza, enfim, com a realidade. Nem a evolução poderia ter feito melhor, nem a natureza, nem a realidade.
As explicações eram as melhores e as mais inteligentes.
Mas este é o problema das explicações. São sempre as melhores e as mais inteligentes, em cada momento e em cada lugar.
O que não significa que sejam boas.
Por exemplo, atualmente, as explicações da ciência são as melhores de sempre. No entanto, só explicam o óbvio e não explicam o que não sabemos, que não é óbvio.
Deuses e Deus não são óbvios.
O menos óbvio é "por que acreditam as pessoas naquilo que não é óbvio"?
O mais óbvio é "as pessoas acreditam naquilo que veem, mais facilmente do que naquilo que lhes dizem".
Mas Deus é uma construção da inteligência, tal como a ciência e todo o conhecimento. Não quer isto dizer que a inteligência, ou a ciência, ou o conhecimento "criam" Deus ou as coisas. Quer dizer, por exemplo, que fazem o sentido necessário e suficiente, ou têm a coerência, para merecerem atenção especial, para além da mera hipótese de trabalho.
Com efeito, a ciência, sob pena de se negar e contradizer a si própria, nunca se imiscuiu na questão de Deus enquanto entidade "construída" pelo homem.
É certo que a ciência pode e deve investigar se e que "construção" é essa. Mas, na atualidade, quando a ciência procura as origens, já o faz, assumidamente, não em busca de um deus, mas em busca de uma causa desconhecida.
A incompatibilidade entre ciência e religião pode estar em vários aspetos, mas não me parece que seja ao nível do conhecimento.
A religião é uma realidade que a ciência estuda até onde pode e sabe.
A ciência é uma realidade que a religião estuda até onde pode e sabe.
A incompatibilidade, não sendo ao nível do conhecimento, a existir, é de ordem normativa e moral.
A religião é um sistema de crenças, não simplesmente de ordem moral, baseado na ética do bem e do mal e respetivos sentimentos, mas não só.
A religião não existe com vista à investigação, mas com vista à santidade, numa perspetiva que nada tem a ver com o "interesse" do indivíduo enquanto animal, porquanto sobrepõe ao próprio interesse, valores que considera transcendentes (um ignorante, um burro, um louco...pode ser santo, enquanto um sábio, um inteligente, um lúcido, pode ser renegado).
Neste aspeto, pelo menos, a incompatibilidade pode ser total. O juízo científico e o juízo religioso não só não têm de coincidir como, aliás, o ótimo "científico" pode ser o péssimo "religioso" e vice-versa.
A demanda de explicações é a essência da ciência.
A demanda de deuses é a demanda de explicações.
Para que um deus explique, necessário é ter sido encontrado.
Parece que foram encontrados muitos deuses que serviram de explicação para muitos fenómenos.
Parece também que foram encontradas explicações, deuses, contraditórias ou, pelo menos, não compatíveis. Essa era a ciência disponível para o cérebro que havia. Estava tudo em ordem com a evolução, com a natureza, enfim, com a realidade. Nem a evolução poderia ter feito melhor, nem a natureza, nem a realidade.
As explicações eram as melhores e as mais inteligentes.
Mas este é o problema das explicações. São sempre as melhores e as mais inteligentes, em cada momento e em cada lugar.
O que não significa que sejam boas.
Por exemplo, atualmente, as explicações da ciência são as melhores de sempre. No entanto, só explicam o óbvio e não explicam o que não sabemos, que não é óbvio.
Deuses e Deus não são óbvios.
O menos óbvio é "por que acreditam as pessoas naquilo que não é óbvio"?
O mais óbvio é "as pessoas acreditam naquilo que veem, mais facilmente do que naquilo que lhes dizem".
Mas Deus é uma construção da inteligência, tal como a ciência e todo o conhecimento. Não quer isto dizer que a inteligência, ou a ciência, ou o conhecimento "criam" Deus ou as coisas. Quer dizer, por exemplo, que fazem o sentido necessário e suficiente, ou têm a coerência, para merecerem atenção especial, para além da mera hipótese de trabalho.
Com efeito, a ciência, sob pena de se negar e contradizer a si própria, nunca se imiscuiu na questão de Deus enquanto entidade "construída" pelo homem.
É certo que a ciência pode e deve investigar se e que "construção" é essa. Mas, na atualidade, quando a ciência procura as origens, já o faz, assumidamente, não em busca de um deus, mas em busca de uma causa desconhecida.
A incompatibilidade entre ciência e religião pode estar em vários aspetos, mas não me parece que seja ao nível do conhecimento.
A religião é uma realidade que a ciência estuda até onde pode e sabe.
A ciência é uma realidade que a religião estuda até onde pode e sabe.
A incompatibilidade, não sendo ao nível do conhecimento, a existir, é de ordem normativa e moral.
A religião é um sistema de crenças, não simplesmente de ordem moral, baseado na ética do bem e do mal e respetivos sentimentos, mas não só.
A religião não existe com vista à investigação, mas com vista à santidade, numa perspetiva que nada tem a ver com o "interesse" do indivíduo enquanto animal, porquanto sobrepõe ao próprio interesse, valores que considera transcendentes (um ignorante, um burro, um louco...pode ser santo, enquanto um sábio, um inteligente, um lúcido, pode ser renegado).
Neste aspeto, pelo menos, a incompatibilidade pode ser total. O juízo científico e o juízo religioso não só não têm de coincidir como, aliás, o ótimo "científico" pode ser o péssimo "religioso" e vice-versa.
domingo, 5 de fevereiro de 2017
Poder, ciência e valores
É o poder, são os poderes, as políticas, a vontade dos homens que podem, que têm e detêm o poder económico, financeiro, militar, que estão em crise. A ciência e os valores universais da justiça, da liberdade, da igualdade, da solidariedade, dos direitos do homem, incluindo o direito a um ambiente saudável, não estão em crise no sentido de já não serem o que eram, princípios de racionalidade incontroversa, que guiam ou nos ajudam a fazer escolhas.
Pode-se dizer que a crise dos poderes tende a "culpar" estes valores, quando, na realidade, é desencadeada pelo facto de estarem a ser "julgados" por eles.
Vejo razão para optimismo nesta crise dos poderes, pese embora o perigo sempre iminente de vermos e sofrermos os efeitos violentos dos seus estertores de morte.
Aliás, vejo razão (e não adeus à razão) em tudo que está a acontecer.
É preciso não confundir poderes, políticas, vontades, ações, comportamentos, acontecimentos, com valores e com ciência.
Os valores e a ciência, como tudo, em geral, estão numa dependência inelutável dos poderes e da vontade de quem pode. Isto tem sido a fonte das maiores tragédias e infâmias da humanidade. A esperança reside na capacidade que tivermos de controlar o poder, pelos valores e pela ciência.
Durante algum tempo ensinaram-nos que era isto que estava a acontecer e iria acontecer. Temos vindo a verificar, não com muita surpresa, diga-se de passagem, que os suspeitos de sempre, subverteram habilmente o sistema, ao jeito de sempre.
Parece que a ciência das escolhas, não por culpa da ciência, obviamente, é o que está mais longe da mente daqueles que assumem (?) e que estão, em primeira linha, investidos da responsabilidade de "escolher" e decidir o melhor para a sociedade, ou seja, os políticos.
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