quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Democracia e plutocracia


      As democracias dos países têm muito pouco poder no (des)concerto das nações, ou por outra, perante as plutocracias sem fronteiras. 
      As democracias já têm muito pouco de democracia. Apresentam-se como "pacotes" de propostas estereotipadas de partidos que são, por sua vez, estruturados em função de um sistema eleitoral também gizado para que o sistema político-social dito democrático cumpra, não a vontade do povo, mas a função de "converter" formalmente a vontade do povo numa legitimação do sistema. 
      E assim se conciliam princípios aparentemente inconciliáveis, como o princípio da primazia do lucro (proveito pecuniário) sobre o princípio da racionalidade da exploração dos recursos, ou sobre o princípio da soberania da nação. 
      Cada vez é mais difícil aos poderes políticos estabelecerem e imporem limites aos poderes financeiros e económicos transnacionais, até porque estes se apresentam, cada vez mais, supranacionais e não conhecem fronteiras e, além disso, tendem a ser dominantes nos processos de decisão política dos Estados. 
      A voracidade desta espécie de liberalismo incontrolável é assustadora, porque domina sem se deixar "governar", nem por regras que sejam suas.

      A plutocracia, mafiosa ou não, obtém tudo sem dar garantias de nada, contrariamente ao cidadão que, mesmo para obter "nada", tem de dar garantias de tudo. Basta pensar num empréstimo bancário a um cidadão ou pequena empresa. Todas as garantias, pessoais e reais, lhe são exigidas, desde fianças a hipotecas. Mas um banco consegue obter financiamentos colossais, com dinheiros públicos (e aqui é que está o escândalo), sem dar e sem lhe serem exigidas, quaisquer garantias, como temos assistido ultimamente em Portugal.



quarta-feira, 16 de julho de 2014

Verdade redentora



Nunca antes me tinha deparado com a expressão "verdade redentora", mas intuo-a como a verdade que procuramos quando perguntamos o que é a verdade. 

É árduo conceber que a contingência, por vezes trágica, da vida, é o único lugar/oportunidade que temos (ou nos é concedido) para pensarmos e encontrarmos "a pretensão do absoluto". 
Mas é mais espantoso, ainda assim, que não nos conformemos/contentemos com menos, nunca sendo sequer capazes de "dispor" do Eu, cuja "realidade", de qualquer modo, nos ultrapassa.


quinta-feira, 10 de julho de 2014

Sobre a relação entre conhecimento e consciência.


Um robot pode ser uma base dinâmica de dados mas, sem consciência do "valor" desses dados, parece óbvio que não é mais do que um automatismo. 
Por sua vez, 
as pessoas que não processem, ou não elaborem, ou não aprofundem as informações e as perceções e as ideias e os sentimentos e as emoções, ou apenas as elaborem em parte, terão o âmbito do seu conhecimento limitado ao campo de consciência de que forem capazes. 
Não obstante, 
o nosso consciente é infinitamente mais circunscrito e reduzido, por um conjunto enorme de fatores, do que a vastidão do subconsciente ou do que o imenso inconsciente. 
Na prática, o nosso consciente é como um postigo, ou uma seteira, ou uma gateira, muito menos do que uma janela ou do que uma porta, da grande casa que é a nossa mente. 
E cada um tenderá a olhar mais para fora ou mais para dentro, mas a olhar sempre de uma perspetiva que lhe é proporcionada pela natureza das coisas.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

As linguagens



Gosto destes temas e, na minha modesta opinião, as linguagens são como oceanos sobre os quais flutuamos, mas cujas profundidades continuam por explorar. 
A nossa relação com o sensível desencadeia complexos sistemas de reconhecimento e mapeamento cerebral. Não o que nós queremos mas o que acontece e que, até certo ponto, se vai constatando.
Fazem parte do mundo sensível as próprias linguagens, e de tal modo que a nossa sensibilidade é, em muitos casos, indissociável da linguagem. A linguagem como significante e a linguagem como comunicação ou, simplesmente, como expressão, partilham do espaço de realidades que as excedem e, de certa forma, elas significam. 
Estou em crer que a linguagem é um processo mental que nos permite reconhecer, analisar e distinguir. Neste processo, vão-se abrindo possibilidades de reconhecer, ou descobrir, o que for suscetível de ter significado. E tudo significa algo, pelo menos é assim que a mente funciona. Quando perguntamos “qual é o significado de…” normalmente a resposta é outro significante. É como se tivéssemos apenas a linguagem, os significantes, mesmo quando estamos a falar de coisas que estão perante os nossos sentidos, ou como se os significantes lhes tomassem a primazia, como se fossem mais reais do que aquilo que pretendem significar. 
O que as nossas descrições têm a ver com aquilo que descrevemos é um problema que pode não ter cabal solução.
A nossa relação com as ideias e as formas tende a ser o problema da linguagem enquanto forma. Podemos falar das coisas sem coisas nenhumas, embora essas coisas sejam reconhecidas como existentes, ou tendo existido. Mas não me parece que alguma linguagem o seja se não for funcional, isto é, se não cumprir algum desiderato de comunicação. 
Também me parece que o problema da verdade para a filosofia seja mais de linguagem e para a matemática, de correspondências e que, para a religião, seja essencialmente de virtude. 
Por exemplo, a virtude desta linguagem não existe, a linguagem não é nem deixa de ser virtuosa à luz de critérios morais ou religiosos. Mas, em termos de lógica, ou de epistemologia, esta linguagem pode ter acrescentado apenas umas frases sem verdadeiro nexo ou cujo nexo não passa disso mesmo.



sábado, 17 de maio de 2014

O Estado não tem maneira de dizer que não é nosso


Vivemos tempos de enorme desconforto quanto a saídas para certos bloqueios e sequestros e imposições, para não dizer fatalidades. 
A eficiência dos serviços do Estado é sempre bem-vinda na perspetiva de quem "superintende" o Estado, ou se quisermos, numa perspetiva meramente económica. 
O que todos devíamos saber é que, tratando-se de mecanismos, ou de fatores económicos, o que é bom para o Estado, muitas vezes não o é para o privado e isto não quer dizer que é mau que assim seja, mas há quem se esgadanhe todo por achar que só o que é bom para o privado pode ser bom para o Estado. Diria, aliás, que o desafio é conceber e racionalizar uma economia, pelo menos tri-fronte: privada, pública e internacional. 
O problema da globalização também não está ausente. 
A ineficiência da máquina do Estado é um problema que será sempre atual, do mesmo modo que o da ineficiência das empresas privadas. Faz parte do próprio sistema racional (de rácios) de controlo e de auditoria e de avaliação. Mas isso, em suma, não é um problema, é a realidade das coisas. 
O que é e será um problema é o investimento público. 
Para o privado o investimento é ou não é um problema de quem investe mas, subordinado a rácios de rendibilidade, é um problema sério se for à custa da vida de milhões de pessoas, ou do próprio planeta. Isto é odioso e perigoso e ameaçador, há muito tempo, com muita, muita mesmo, demasiada colaboração e subserviência dos meios científicos e tecnológicos, que se revelam mais insensíveis e despreocupados, do que seria de esperar, quanto às consequências da multiplicação das "máquinas de fazer dinheiro".
O que é (ou não é) problema para o privado, e pode até ser o grande objetivo lucrativo, é ou pode ser um grande problema para o Estado. Falar em investimento público tem esta desvantagem do apagamento em que fica, porque o privado lhe rouba o palco. 

É que investimento público é um conceito de investimento que tem poucas afinidades com o de investimento privado. O retorno do investimento esperado/pretendido pelo Estado não é da mesma ordem, sócio-espácio-temporal-económica... do do investimento apostado pelo privado. 
A maior parte das vezes o investimento do Estado é um esforço titânico para "remediar" os efeitos nocivos do investimento privado. 
E quando isto é mais assumido e declarado por razões especialmente críticas (como a atual crise), vem ao de cima uma incompatibildade feroz, que não devia existir, entre público e privado. 
Para tornar as coisas mais desconfortáveis, o público, normalmente, é instrumento nas mãos de poderes privados, mais ou menos organizados, mais ou menos influentes, mais ou menos dominantes. Estes poderes sabem muito bem o que lhes interessa que o Estado seja e o que não lhes interessa. Interessa-lhes que o Estado trate de umas coisas e que não se ocupe de outras. O que é importante é que se averigue e se perceba porquê e se isso interessa ao Estado, enquanto estrutura representativa de realidades territoriais e demográficas e histórico-culturais que não se compadecem com os balanços e contabilidades de A, B ou C. O Estado não tem maneira de dizer que não é nosso.


sábado, 10 de maio de 2014

O direito de não competir



Elogiaria a forma, muito interessante e reflexiva, de expressar quanto a poesia pode ser como a febre, um sintoma de alguma coisa que é preciso solucionar.
Para o poeta, os arrazoados dos que professam a religião das urgências e das pressas e dos progressos, são artifícios como outros quaisquer, mas que não devem ser impostos a ninguém, como ninguém deve ser obrigado a competir com ninguém. Devia ser acrescentado um direito à lista de direitos do homem "o direito de não competir, nem a feijões". 
Sabendo nós (previsivelmente) que vai acabar tudo numa nuvem de poeira, seria de esperar que a organização e gestão do nosso tempo fosse feita em função da efemeridade. 
Quando nos pedem para sermos racionais e científicos, seria de supor que esperassem de nós algo diferente de andarmos a matar-nos antes do tempo porque queremos sobreviver à perseguição, ou pressão, a que estamos sujeitos. 
A realidade é a única coisa que interessa à ciência, mas é a única coisa que o homem não aceita e, vai daí, engendra todas as técnicas e mais algumas para a transformar em algo diferente... 
Um dia deixaremos de morrer tecnicamente.



terça-feira, 8 de abril de 2014

A aprendizagem dos valores



A aprendizagem dos valores, paradoxalmente, é (pode ser) um factor de agitação, indisciplina, descontentamento, decepção, revolta... A civilização não é pacificadora, justamente porque o mundo está nas mãos de quem não faz o que deve e não olha a meios para fazer o que quer, podendo.
A aprendizagem dos valores é o que há de mais subversivo, não porque favoreça uma vida de acordo com os mesmos, mas porque põe a nu o problema de as pessoas serem ou não capazes, quererem ou não quererem, serem ou não serem obrigadas, a conformar as suas condutas com esses valores.
O Estado, infelizmente, está numa crise plena, no que a valores respeita e, no entanto, arroga-se o monopólio da coação que, não sendo arbitrária, institucionaliza e consente (quando não promove) políticas "loucas" e "vertiginosas" para lado nenhum, mas tudo à volta do dinheiro, o valor último.