É preciso mais do que explicar e justificar, tanto quanto é
necessário, a relação que existe entre o “dinheiro” e o “preço do dinheiro” e
entre a “importância do dinheiro” e o “mercado do dinheiro”.
Gerir dinheiro e produzir ou reproduzir dinheiro é uma
ciência e uma arte.
Espantar-me-ia se me dissessem que as maiores inteligências gravitam
em torno desse astro, uma vez que encandeia quem o vê e priva da vida os outros.
Mas do ponto de vista da ciência e da arte, nada a opor, é
uma ciência e uma arte com o valor das ciências e das artes.
Só que, a ciência e a arte e o dinheiro, não valem por si
mesmos, senão pelo que representam ou possibilitam. Nesse aspeto o dinheiro,
pela fungibilidade, é o bem de liquidez por excelência.
Dentro da lógica fechada do “dinheiro gera/pode gerar
dinheiro” e de que tudo o que gera dinheiro é bom, o investidor privado não tem
muito por onde escolher. Os custos de oportunidade equacionam-se sempre em
função de uma rentabilidade, mais ou menos imediata, sem consideração, por ex.,
por externalidades negativas.
Na minha perspetiva, o nosso tempo está a produzir a
inteligência necessária e urgente (e obrigatória) para organizar e gerir o
mundo enquanto planeta que está em perigo, por culpa dos humanos (e mesmo que o
não fosse).
Vamos ter que ser muito claros e entendidos sobre aquilo que
queremos, não enquanto investidor privado, mas enquanto coletividade, não
enquanto EUA, mas enquanto Comunidade Mundial de países.
A questão do “valor económico” vai ter de prevalecer sobre a
lógica do retorno do investimento e do lucro. E isso só será possível se se
pré-ordenarem os fins do privado aos fins do público.
Gerir o privado e gerir o público são realidades e
problemáticas diferentes, senão antagónicas.
A justificação dos fins pelos meios, no privado, é uma
coisa, no público, é outra, completamente diferente.
No privado, o lucro “justifica” que me vendam três sacarrolhas
mesmo que eu não use.
No público, não existe justificação para que alguém compre
algo de que não precisa. Mas todos conhecemos muitos exemplos bem mais
eloquentes do que este, como o do homem que compra vinte ferraris com o único
objetivo de os destruir.
Para o privado, a ciência, a educação, a religião e a arte
são mercadorias. Tudo o que possa gerar dinheiro.
Para o público, o dinheiro começa por ser o maior problema,
porque os fins não são o dinheiro. Qualquer política que, por equívoco ou não,
não pressuponha claramente que os fins do Estado não são o retorno, será
desastrosa para todos.
Ao Estado compete, ao contrário dos privados, promover o bem
estar, o desenvolvimento, a saúde, a educação, a paz, a justiça, o ambiente
saudável.
Ao investir em ciência e tecnologia o Estado, em teoria, é a
entidade que não pode deixar de agir com inteligência, sob pena de não obstar
ao descalabro para que nos encaminhamos.
Nenhum investidor privado tem a obrigação de se preocupar, por
exemplo, com o facto de o retorno do seu investimento ser ilegítimo, ou
resultado de um efeito desastroso para a economia (por ex., numa perspetiva de
consumismo destrutivo).
Infelizmente, para a população em geral, os partidos que “conquistam”
o Estado fazem-no sem uma visão para o papel e as funções do Estado num mundo que
tem de ser gerido e partilhado coletivamente, com ciência, economia,
consciência, justiça e não, como até aqui, ao sabor da ambição, aventureirismo
e poder de espada de cada um.
Falar de privatização do ensino, por exemplo, requer que, antes de mais, se defina claramente, não o que é privatização em geral e abstracto, mas o que seria privatização do ensino. Privatizar é um verbo como outro qualquer, mas privatizar uma empresa é algo mais complexo do que simplesmente privatizar. A ideia de privatização, como a sua 'antagónica' de coletivização, ou nacionalização, ou expropriação, não têm nada de mal ou de inconveniente, de certo ou errado, de mau ou de bom, de vantajoso ou desvantajoso. Só se encararmos as coisas (e os conceitos) sem preconceitos é que poderemos fazer a avaliação necessária do que está em causa e em jogo, para, de seguida, tentarmos escolher uma política, linha de acção, alternativa entre outras... e dizer porquê, na esperança de que a nossa análise e as nossas razões sejam entendidas pelos outros e resistam suficientemente à contra-argumentação dos vários quadrantes.
Se me convencessem, com boas razões, de que privatizar o Ensino, ou a Justiça, ou a Ordem pública, ou a saúde, do mesmo modo que as fábricas de salsichas e de aros de bicicleta são privadas, traziam, não apenas o mesmo nível/valor de satisfação das necessidades, mas um valor acrescido, eu pensaria ainda em muitas questões tão importantes ou mais do que essas. Privatizar, aparentemente, seria fácil. A questão dos custos para o Estado é uma questão cuja resposta devia haver alguém capaz de dar, mas não há. Não é uma qualquer resposta. Mas se a privatização do ensino ou dos outros sectores públicos, feitos os estudos e as contas (e obtidas as garantias adequadas de que assim iria ser) resolvia todos os problemas que é preciso resolver e não trazia outros, ainda que menores, que mal veríamos nessa privatização?
Se os problemas fossem meramente de custos financeiros... Pegar nos problemas do Ensino, Justiça, Saúde, Ordem e segurança públicas pelo lado dos custos financeiros é a pior forma de tentar perguntar por que é que o Estado é preciso.
Chamo a atenção para a diferença (importante) entre 'ensino privatizado' e ensino privado.
O ensino privado sempre existiu e não é proibido. Cada um, ou em associação, sociedade, etc., pode conceber um sistema de ensino ao seu gosto e tentar operacionalizá-lo. Até os partidos políticos podem criar escolas para ensinarem as ideologias ou o que lhes aprouver. E os alunos, que tenham dinheiro e condições para isso, podem sempre procurar aprendizagens e sistemas de ensino ao seu gosto/interesses, nas artes, desportos, ciências, indústrias, etc...